No início de qualquer reflexão sobre o retorno e o risco de uma classe de ativos é o estudo do retorno e risco histórico. No caso do ouro, embora estejam disponíveis dados com alta qualidade dos últimos 200 anos, há uma peculiaridade. Os dados de retorno anteriores aos anos 1970 devem ser ignorados. Antes de 1971 o ouro era a moeda de facto nos Estados Unidos, Reino Unido e muitos outros países. Isso significa que as moedas nacionais tinham uma taxa fixa de câmbio com o ouro durante a maior parte desses 200 anos – o padrão ouro. O preço do ouro era fixado pelo Estado e não flutuava livremente com base na oferta e demanda, como ocorre hoje. Se ouro e dinheiro são a mesma coisa, então, naturalmente, o ouro medido em dinheiro só podia ter um retorno de zero.
O padrão ouro clássico foi abolido em diferentes países entre 1914 e 1937. Em 1944, foi introduzido o chamado sistema de Bretton Woods. O resultado do acordo foi de que apenas o dólar dos Estados Unidos tinha um preço fixo em ouro. Outros países ocidentais atrelaram as suas moedas ao dólar. O resultado foi um padrão ouro indireto. O sistema de Bretton Woods foi encerrado unilateralmente pelo governo dos EUA em agosto de 1971.
Também é necessário adicionar que em muitos países era proibido possuir ouro. Especialmente em países com regimes socialistas e comunistas quem possuía ouro em casa corria sérios riscos. Em alguns países autoritários a posse de ouro privado puída resultar na pena de morte. Um risco que não é capturado pela análise fira de risco e retorno podarão. Mas, até os países democráticos e de direto como os Estados Unidos proibiam quantias maiores em propriedade particular. Quem desafiava a lei corria o risco de ter que pagar multas, ter seu ouro confiscado e de passar até 10 anos na prisão.
Com a abolição do padrão ouro, as regras do jogo para o ouro como investimento mudaram fundamentalmente. A partir 1971 o preço do ouro passou a flutuar de acordo com a lei da oferta e demanda do mercado. Antes dessa data, os retornos reais do ouro eram muito menores do que depois. De 1792 a agosto de 1971 (180 anos), o preço real do ouro em dólares caiu em média 0,4% ao ano. Isso equivale a uma queda acumulada de mais de 50%! Com a liberação do mercado em setembro de 1971, os retornos do ouro aumentaram significativamente em comparação com os 180 anos anteriores.
Em dezembro de 1974 os Estados Unidos liberaram a propriedade particular de ouro. Nos três anos entre o fim do padrão ouro em agosto de 1971 e a legalização da propriedade privada de ouro nos Estados Unidos em dezembro de 1974, o preço real do ouro em dólares subiu 44,2% ao ano. O aumento significativo do preço foi resultado de uma demanda reprimida por anos e provavelmente não irá se repetir. Investidores arrojados compravam ouro em antecipação da liberação da posse privada nos EUA considerando o fim do padrão ouro. Fica a seu critério se você considera o fim do padrão ouro ou a liberação da posse privada de ouro nos EUA como data inicial para a sua análise. Porém, uma analise a partir de 1975 é mais prudente olhando para frente.
Como pode ser visto, comparado com ações, a rentabilidade do ouro decepcionou. A seguir mais algumas perguntas e respostas sobre ouro.
É uma pergunta extremamente difícil. Contrário a aplicações em ações, renda fixa e imóveis, o ouro não gera um fluxo caixa positivo. O ouro não paga dividendos, juros ou aluguel. Ao contrário, ouro tem um alto custo de armazenamento e a ausência de retorno de dinheiro dificulta a avaliação do valor justo. A única forma de obter um ganho ao investir em ouro é vende-lo por um preço mais alto. Para que isso aconteça, é necessário que uma parcela relevante dos investidores continua acreditando no valor do metal. Um outro problema na precificação do ouro é ausência de uma demanda relevante da indústria. Comparado com outros metais, a utilidade de ouro na produção de bens é limitada. Apenas 8% do ouro disponibilizado pelas mineradoras e pelos processos de reciclagem acaba sendo usado na indústria – principalmente na produção de dispositivos eletrônicos. O principal ouso do ouro acaba sendo joias, reservas de bancos centrais e investimento.
Sim e não. Se fosse possível extrair até a última grama o ouro estimado na Terra, seria possível cobrir toda a superfície da Terra com uma camada de ouro puro de quatro metros de espessura. É uma quantidade inimaginável! Mesmo com a quantidade teórica disponível, o ouro continua sendo valioso. O valor e a escassez do ouro é o resultado da dificuldade da extração do metal. Depósitos de ouro apresentam uma baixa densidade, ou seja, é necessário movimentar muita terra para extrair apenas um quilo de ouro.
Depende. Ouro historicamente é uma excelente reserva de valor. O soldo de um soldado no império romano era pago em ouro e equivale aproximadamente o salário de um soldado americano hoje. Ou seja, o ouro consegui manter o poder de compra através de milhares de anos. Uma conquista impressionante. Ao mesmo tempo, o valor do ouro oscila extremamente e tem pouca relação com a inflação no curto prazo ou até sobre um horizonte de décadas. Um estudo interessante avaliou o ouro como proteção para a hiperinflação no Brasil dos anos 80 até o ano 2000. O resultado decepciona. Em termos reais o investidor em ouro sofreu uma perda de 70% do seu poder de compra. Traduzindo, quem tinha dinheiro para comprar um carro da Mercedes precisou se contentar com um carro popular duas décadas depois.
Se o seu objetivo é manter o poder de compra em mil, dois mil ou até mais anos, ouro é uma feramente excelente. Sendo racional, é improvável que alguém tenha um horizonte de investimento que se estende por mais de algumas décadas. Portanto, ouro tem pouca utilidade na proteção contra a inflação.
Depende da definição de desastre. Tempos incertos geram demanda pelo ouro por parte dos investidores. Isso podia ser observado na crise imobiliária dos Estados Unidos e a crise da Zona do Euro em 2012. Em ambas as instancias o preço do ouro renovou novas máximas históricas. Se as crises no mercado financeiro poderiam ser consideradas desastres é aberto a debate. Tragedias reais como a primeira e segunda guerra mundial resultaram em uma queda do preço de ouro medido em dólar. Para quem acredita no fim do sistema financeiro ou da sociedade e que enxergar no ouro uma forma de se proteger, vale a consideração de comprar invés de ouro comida enlatada e uma arma para defender o seu estoque de comida.
A vantagem principal do ouro é a sua alta concentração de valor. O equivalente de malas cheio de dinheiro poderia ser convertido em apenas algumas barras de ouro. Um atributo valioso para quem gostaria proteger os seus bens de um confisco do governo. Além disso, é difícil rastrear ouro. Mas, hoje em dia tem soluções mais sofisticadas como empresas offshore, trusts e fundações privadas para não depender do ouro. Até uma simples conta bancária em um outro país da sua residência com um regime democrático e segurança jurídica trazem proteção adicional.
A forma mais comum der ter ouro é através de joias. Afinal, 52% do ouro disponibilizado no mercado acaba sendo usado para a produção de joias. Quem já tentou vender as suas joias deve ter ficado surpreso. É comum que material de uma joia representa apenas 20% a 30% do valor de venda na joia. O preço alto de joias é devido o marketing, o custo de venda, impostos e por se tratar de uma obra de arte. Infelizmente isso não conforta acha que joias podiam ser um investimento. Ainda pior é o caso se a joia é carregada de diamantes e outras pedras preciosas. Extrair os diamantes no processo de reciclagem do metal gera custos e algumas vezes os diamantes não são reutilizados. Joias são obras de arte e devem ser tratados como. Quem vê joias como investimento é enganado.
Sim, investir uma parcela da sua carteira em ouro traz o benefício da diversificação. Generalizando, em momentos em que ações estão em queda, o preço do ouro é estável ou subindo. Mesmo assim é importante avaliar se pela rentabilidade histórica baixa vale incluir ouro em uma carteira de investimentos. Carteiras com uma parcela maior de renda fixa podem ser uma solução mais eficiente.
Não. Ouro é apenas cotado em dólar. Como o dólar domina o comercio e o mercado financeiro é natural que uma grande variedade de commodities (recursos naturais) sejam cotados em dólar. A a taxa de câmbio do dólar não influencia estruturalmente o preço do ouro. Um dólar fraco não causa um aumento no preço acima da inflação do ouro, enquanto um dólar forte não gera uma desvalorização do ouro. O fato que o preço do ouro é cotado em dólar não possui relevância econômica. Uma comparação seria: distâncias não mudam se são expressas em milhas ou quilômetros.
O ouro só seria considerado um ativo em dólar e ligado ao prospecto da economia dos EUA se uma parcela relevante da produção e demanda global anual originasse dos Estados Unidos. Isso não é o caso. Nos últimos anos a produção de ouro nos EUA representou apenas 7% da produção global. A China é o maior produtor e em termos de demanda, os Estados Unidos ficam muito atrás da China, da Índia, e estão apenas ligeiramente à frente da Alemanha.
Historicamente o retorno real do metal foi perto de 0% ao ano. Mas, isso não impede que o ouro tenha anos com retornos excelentes. O que qualquer investidor em ouro deveria estar ciente é, investir em ouro carrega risco relevantes com uma perspectiva de retorno acima da inflação duvidosa.